domingo, 25 de abril de 2010

A ética no cotidiano do brasileiro


Modelo de formatao de PDF


José Cícero Gomes

A racionalidade humana, com suas peculiaridades, suscita reflexões sobre a vida em sociedade, e sobre a interação social nos diversos meios sociais onde o indivíduo exerce seus vários papeis. A Filosofia se ocupa com particular sagacidade da busca pelas respostas às questões que diz respeito à conduta humana. Como se constrói uma conduta ética e com se combate condutas antiéticas?

Em sua constituição, o ser humano, e fruto de um processo de ensino-aprendizagem, constrói-se a partir de um legado cultural. Ninguém nasce mal, corrupto ou imoral, ninguém nasce predestinado a ser um santo ou um demônio. Partindo desta premisse podemos afirmar que o ser humano é um produto cultural fruto da moldagem de sua sociedade. “A ética é a estética de dentro[1] com esta frase o poeta cubista francês Reverdy sintetiza o que é ser ético. Segundo Aristóteles ser ético é: “Sê senhor da tua vontade e escravo da tua consciência[2]. A análise destas frases nos leva a crer que a ética é fruto de uma consciência crítica sobre as ações cotidianas. Não cabe, no entanto, buscar definições biológicas ou respostas históricas para a falta de caráter de alguns brasileiros.

A história do Brasil é recheada de exemplos de homens públicos que usam o poder do seu cargo em benefício próprio, faltando com uma conduta ética que deles se espera. Ao contrario do que nosso povo pensa que manifestações e movimentos de combates a ações antiéticas não levam a nada, tais manifestações de caráter popular têm dado resultados. Não se pode, fechar os olhos para o errado. Temos que aprender a nos indignarmos com a pouca vergonha, com falta de caráter, com a corrupção, com as injustiças sociais que ainda fazem parte da conjuntura cotidiana do povo brasileiro.

A ética, nos dias de hoje, é algo que ocupa um lugar primordial desde as conversas de botequins as salas de reuniões de grandes empresas, constatamos que nunca se falou tanto em ética neste país como agora. Mas nunca se faltou tanto com a ética como em nossos dias, alguns incautos costumam banalizar o problema, dizendo que é algo crônico que sempre foi assim, e nunca irá mudar. É nesta hora que me vem à mente Rui Barbosa: "De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer as injustiças, de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos homens, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto."[3] Esta sua afirmação infelizmente é fato no Brasil atual. Há uma grande preocupação com a corrupção dos políticos, mas não é apenas a falta de conduta dos homens públicos que pode ser considerada desvio de conduta, embora estes recebam maior atenção do público quando a impressa marrom divulga seus atos imorais, fato este que em nosso país não ocorre com freqüência. Já que os meios de comunicações brasileiros quando não são destes políticos corruptos, estão a serviço. Embora as atitudes antiéticas dos políticos chamem mais atenção da opinião pública. É o caso de questionarmos todo e qualquer ato que revele desvio de conduta e falta de caráter por parte de qualquer um cidadão.

As leis são um freio para os crimes públicos, a religião para os crimes secretos”.[4] Infelizmente esta máxima não é uma verdade no Brasil, aqui político, magistrados e militares muitas vezes agem como se estivessem acima da lei, religiosos de varias crenças do catolicismo, protestantismo ao candomblé logram seus fieis seguidores sem um pingo de dor na consciência. Logo as leis e a religião têm perdido a eficácia, e os homens de lei e de religião têm esquecido seu verdadeiro papel de reconduzir os homens ao caminho do bem.

Esses atos de desvio de conduta são praticados por indivíduos interessadas em obter vantagens pessoais, tais como riqueza material (capital), prazer (sexo) e prestígio (status social). Nesta contextualização o interesse pessoal parece sobrepor-se ao bem comum.

Sartre resume sua concepção na frase a cerca do eu: “Eu sou aquilo que fiz com aquilo que fizeram de mim.”[5]A filosofia existencial de Sartre vem nos revelar que os desvios de condutas dos indivíduos resultados da formação que estes indivíduos receberam de sua sociedade, com isto, voltamos a enfatizar que somos produtos do meio social. Jean-Paul Sartre sugeriu, em seu existencialismo, a idéia de que a essência do ser humano se constrói tanto a partir das escolhas que nós mesmos fazemos quanto das escolhas que outros fazem por nós, somos fruto de um longo processo de ensino-apredizagem, como afirmava Claude Lévi-Strauss: “o homem e um animal cultural”.

Enfim, a construção do ser humano é, inegavelmente, uma produção cultural e os indivíduos são sem soma de dúvidas produtos da moldagem social. Somos reflexos de nossos pais, naturais ou postiços. Somos produtos de uma família ajustada ou desajustada. As famílias são as células somáticas da sociedade, se algumas delas estão cancerígenas, logo toda a sociedade estará doente. Político corrupto, traficantes, o ladrão comum, pedófilos, os sadomasoquistas, os charlatões e muitos outros... Todos vinheram de uma família onde na maioria delas havia desvio de conduta. Esses exemplos servem para refletirmos sobre os motivos que levam um indivíduo a cometer atos considerados criminosos. Muitos dos que cometem desvio de conduta, ou seja, atitude antiética no cotidiano é passível de condenação judicial. Mas afinal, por que alguém escolhe deliberadamente a contravenção?

A ética é algo que se tem falado demais no Brasil pois impeachment do presidente Fernando Collor de Mello, mas o que se observa é muita falácia e poucas ações éticas. Os mesmos que falam de ética no Brasil são na maioria das vezes antiéticos e imorais ao defenderem o status quo que os garante a qualquer custo os seus interesses pessoais.



[1] REVERDY, Pierre. Le Livre de mon bord. Paris: 1948, p. 154

[2] Aristóteles apud BERTI, Enrico. As Razões de Aristóteles. 2ª edição. SP: 2000.

[3] Basbosa, Rui apud Pensamento e ações Rui Barbosa.Ed. do Senado federal. DF:1999.

[4] Completas de Rui Barbosa, "A Imprensa", vol. XXVIII, tomo III, 1901, p. 3-8.

[5] SARTRE, Jean-Paul