Busca-se uma releitura de Canudos
Latuscultus - História popular
Este ano completa 115 anos da morte de Antônio Conselheiro e da destruição de Canudos traz um paradoxo. Euclides da Cunha com o seu naturalismo preconceituoso que visou salientar um comportamento patológico dos homens do sertão, inseriu a guerra de Canudos na memória coletiva do povo brasileiro, ao apresentar, em "Os Sertões", a visão de um país dividido por mundos culturais dialéticos.
Se faz necessário cada vez mais trabalhos desmistificadores e sem preconceitos sobre os homens de fé do Nordeste brasileiro do final do século XIX.
Os históridores passam a ver como preconceituosa a obra de Euclides da Cunha, tudo devido a sua avaliação negativa do movimento religioso e da atuação de seu líder, Antônio Conselheiro, que morreu em 22 de setembro de 1897, provavelmente em decorrência de um ferimento na perna, causado por estilhaços de bomba.
Euclides fez do Conselheiro um personagem sombrio e trágico, guiado por forças obscuras, que o levaram à loucura e ao conflito com a Igreja e o estado republicano.
Enfatizou o caráter sebastianista e messiânico de Canudos, cujos habitantes acreditariam no retorno mágico do rei português Dom Sebastião, desaparecido no século XVI, que voltaria para derrotar as forças da República e restaurar a monarquia.
Baseou-se nos poemas populares e nas profecias apocalípticas, encontrados nas ruínas da cidade, que julgou refletirem a pregação do Conselheiro. Explicou assim alguns dos aspectos misteriosos da guerra, como a luta quase suicida dos conselheiristas, ou a migração para Canudos em pleno conflito.
Para o pesquisador baiano José Calasans, começou a surgir a partir dos anos 50 um outro Canudos, diferente daquele criado por Euclides. Esse Canudos não-euclidiano se formou a partir da coleta dos testemunhos de sobreviventes e da revisão dos documentos sobre a guerra. O escritor paulista Ataliba Nogueira contribuiu para tal virada, ao divulgar, em 1974, os escritos do líder da comunidade em "Antônio Conselheiro e Canudos", que acaba de ser relançado pela editora Atlas.
Os sermões de Antônio Vicente Mendes Maciel, o Conselheiro, mostram um líder religioso muito diferente do fanático místico retratado por Euclides. Revelam um sertanejo letrado, cujas concepções políticas e religiosas se vinculavam a um catolicismo devocional, frequente entre os pregadores leigos do nordeste. Seu profetismo, com o ideal de martírio e o desejo de salvação, não continha, ao contrário do que Euclides supôs, crenças sebastianistas ou esperanças milenaristas na criação do paraíso na Terra.
Antônio Conselheiro começou a pregar por volta de 1870 pelo interior do Nordeste e a organizar mutirões para a construção de igrejas e cemitérios. Foi proibido de pronunciar sermões pela Igreja em 1882. Seus conflitos com a ordem estabelecida se agravaram com a proclamação da República. Conselheiro se opunha ao novo regime, que fizera a separação entre Estado e Igreja e introduzira o casamento civil.
Após tomar parte em rebelião contra a cobrança de impostos, fixou-se com seus seguidores em 1893 na região de Canudos, às margens do rio Vaza-Barris, no nordeste da Bahia. Criou Belo Monte como refúgio sagrado contra as secas da região e as leis seculares da República. Baseada na agricultura de subsistência e na criação de bodes para a produção de couros, a comunidade teve um crescimento extraordinário e atingiu uma população estimada entre 10 mil e 25 mil habitantes, criando tensão com os proprietários de terras.
Há um atraso na entrega de madeira, comprada em Juazeiro para a construção de uma igreja, segundo abra eucridiana, foi este o estopim de um conflito armado, que se estendeu por quase um ano, de 6 de novembro de 1896 a 5 de outubro de 1897. Quatro expedições militares foram enviadas contra Canudos e 5.000 soldados morreram nos combates.
Vitoriosas, as tropas da República se vingaram das derrotas sofridas. Prisioneiros foram executados e mulheres estupradas. As ruínas da cidade foram totalmente queimadas. O Exército cumpria as determinações do presidente Prudente de Morais, que declarara: "Em Canudos não ficará pedra sobre pedra, para que não mais possa se reproduzir aquela cidadela maldita". Euclides da Cunha naturalista, ateísta e republicano revela a barbaria dos republicanos, desta república defedida pelo naturalista e condenada pelo Conselheiro. Deste genocídio legitimado pelos pseudos-civilizados e pelo Estado brasileiro surgi uma culpa coletiva quando dão por conta que causaram uma coisa infame e imoral contra os miseráveis sertanesos que não ofericial perigo algum a república brasileira. Fica evidente que os bárbaros não são os fanáticos do sertão mais os soldados do exército brasileiro.