Não
vivemos um novo mundo dantesco e surreal, vivemos o real mundo dos brasileiros que
acham natural serem explorados e defendem a propriedade privada sem terem nem a
privada, alguns fazem suas necessidades fisiológicas no matinho, mas mesmo
assim acham que a propriedade privada é sagrada, e inalienável. Não importando
como se chegou a ter o direito de posse da mesma para que ela seja privada.
Muitas propriedades privadas neste país são resultantes de grilagem de terras e
de fraudes cartoriais. Algumas foram irrigadas com sangue de índios, posseiros,
seringueiros, sem terras e até com sangues consagrados de padres e de freiras.
Aqui
nesta terra de Ceci e Peri, e de mãe Preta e pai João, os pobres têm em suas bocas
o discurso de seus algozes, que por sinal são unidos e articulados. Eles podem
até terem suas divergências, mas quando se trata de defender o dito sagrado
direito da propriedade privada, e seus interesses econômicos e políticos, eles
deixam toda e qualquer divergência de lado, e se unem para garantir seus
interesses muitas vezes escusos.
Agora
o povo é desunido, e uma parcela deste povo brasileiro que tem um feijão mais
gordo do que o operário e o camponês, não se considera nem povo. Falo de nossa
classe média que é assalariada que ganha entre R$ 3 mil reais a 35 mil reais, que
só depende de seu salario para viver, se um membro integrante da classe média perde
emprego e fica sem seu salário está fodido.
Mas
mesmo assim, esse indivíduo não se considera parte integrante do povo. Considera-se
capitalista sem ter capital, defendem neoliberalismo político e econômico sem
se aperceber ou sem querer ver que este irá foder com o seu futuro, e o futuro
dos seus. Defendem o estado mínimo, mesmo sendo sua segurança e estabilidade mínima.
Alguns
chegam até a defenderem cortes na saúde, mesmo dependendo do SUS para fazer um
tratamento quando seu plano privado está ainda em estado de carência ou não
cobre o tratamento; combatem os direitos sociais, e são contras aos programas
sociais de auxilio econômico as parcelas mais miseráveis da população
brasileira. E chegam a reproduzirem o discurso da tal meritocracia entre
desiguais.
Entre
os mais pobres que moram em uma casa de COHB ou em um barraco em uma área de risco
que são eles desde estivador, gari a operário e comerciários e outros também existe entre
eles indivíduos que se dizem de direita, do alto de sua ignorância e
obscurantismo intelectual, sem saberem o que é direita, centro e
esquerda, se julgam de direita e odeiam os esquerdistas. E alguns acreditam realmente que a teologia da prosperidade neopentecostal é capaz de proporciona
sucesso financeiro, e acreditam também em outros engôdos, um deles e a tal meritocracia.
Não
só a classe média, mas muitos entre as camadas mais baixas também defendem o engôdo da meritocracia, pois muitos acreditam que seja uma boa teoria do verdadeiro e justo sistema de gestão, e também acreditam que as migalhas que conseguiram nestes últimos 25
anos, desde há era Itamar Franco até o governo Dilma, foram resultados de seus méritos e não devido a
programas sociais do governo federal.
É tudo isso nos revela uma conjuntura dialética, e meio a tal conjuntura de desarticulação da classe trabalhadora, é como se nós estivéssemos perdidos num labirinto de um terrível minotauro, onde todas
as noites, um ou mais oráculos delfos nos fizessem parar diante deles para ouvi-los e vemos
imagens destorcidas de um holograma de um mundo exterior, nos fazendo lembrar o
Mito da Caverna de Platão, em nosso contexto tais oráculos falam para quase 200 milhões de
seguidores que chamamos de telespectadores. Por um estante pode até nos parecer
que tudo isso não passa de um tenebroso pesadelo, essa realidade que estamos vivenciando, mas infelizmente não é um pesadelo, se
trata da realidade vivida por todos nós brasileiros. E a tal caverna, sem soma de dúvida é a televisão brasileira,
e os oráculos são ancoras do jornalismo venal que manipula e destorce a realidade, e formam a
opinião pública no Brasil.
Entre os oráculos existe um que tem poder maio de convencimento e manipulação e o ancora do tal JN que se apresenta geralmente como o Virgílio da Divina Comedia, só que esse é um pseudo Virgílio,
que nos reanimam em momentos de crises política, econômica e institucional. Digamos de passagem, crises estas que muitas vezes foram criadas pela mídia mais
poderosa do país a televisão, ou legitimada por ela. E logo aparecem os
oráculos: da Globo, Bandeirante, SBT, Cultura e de outras menores, como se
oferecessem a tirar-nos de um sofrimento, fazendo-nos passar pelo Inferno e pelo
Purgatório, mas com uma falsa promessa que iremos chegar ao paraíso. Assim como
Virgílio em ‘A Divina Comedia Humana’.
E todo esse discurso dos oráculos modernos vem justificar e legitimar nosso estado de escravidão. Buscando nos convencer que não há outra verdade além da mostrada por eles. Vamos
imaginar que seja possível a libertação e que alguns dos prisioneiros sublevem o
sistema quebrando os grilhões psicológicos que os prendiam a televisão, mas ao se verem livres buscassem
explorar o mundo externo. Entraria em contato com a realidade e perceberia que
passaram a vida toda analisando e julgando apenas imagens e mensagens que lhes
mostravam verdades destorcidas e meias verdades.
Ao
saírem da caverna e entrarem em contato com o mundo real ficariam encantados
com os seres de verdade, com a natureza, com os animais, e etc. Voltariam para
a caverna para passarem todo conhecimento adquirido fora da caverna para seus companheiros
de infortuno ainda presos. Porém, seriam ridicularizado ao contar tudo o que
viram, ouviram e sentiram, pois seus companheiros só conseguem acreditar na realidade que
enxergam na parede iluminada da caverna, e outas esses companheiros, já são
ilusoriamente felizes como escravos, e até amam a sua escravidão graças ao
consumo e ao entretenimento. Os prisioneiros passariam a chamar esse pequeno grupo
divergente e resistente de um bando de loucos, e como no mito da caverna de Platão iriam ameaçar-los de morte caso não
parasse de falar daquelas ideias consideradas absurdas, esquerdistas e irracionais
por quem nunca souberam o que foi usar o cérebro.
* Professor Cícero